domingo, 29 de janeiro de 2012

O Apanhador de Lenços (ou minha versão do amor)




Muitas pessoas buscam o amor. O amor impossível, o amor inatingível, o amor ideal, o amor surpreendente. Buscam alguém para chamar de seu ou para abraçar durante noites frias e assistir a filmes juntos romanticamente num sábado a noite.
Isso é o que as pessoas definem geralmente por ter um amor.

Mas o amor, tem dessas coisas de querer ser diferente.
E enquanto eu lia a minha revista no banheiro, notei que pela milésima vez tinha esquecido meus lenços umedecidos no outro banheiro de casa, e gritei carinhosamente para o meu marido: “Amor, me faz um favor? Pega meu lenço lá em baixo pra mim?”

Em menos de um minuto depois, estava ele lá a esticar seu braço me entregando o objeto.
E eu fiquei aqui pensando, que o amor tá nessas coisas pequenas e poucas, de quando a gente pede um favor pra pessoa que a gente ama, e ela simplesmente o faz.
Pode ser o lenço umedecido, um copo d’água, aquele livro que estava na estante longe do alcance das mãos, ou a almofada no outro sofá.
O amor está nessas coisas, diárias e cotidianas que a gente nem nota, e que não tem nada de romântico clichê como a clássica cena do casal, com pipoca e coberta na sala de TV, nem tão empolgante como o jantar pomposo no restaurante da moda. O amor está exatamente no momento em que nossos pedidos banais são atendidos por quem a gente ama.

Na tranqüilidade da sua sala de tv, no seu quarto ou até mesmo no sagrado momento do banheiro, não há nada como ter alguém pra atender quando a gente chama.

Antes de procurar esse amor louco e impossível que tentam nos vender por aí, agradeça se tiver alguém pra lhe trazer um par de meias, ou que trouxe aquele copo de água na monotonia da madrugada, só porque você pediu.


Ouvindo_Beale Street Blues_Eartha Kitt

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Hope





Sempre há esperança. Sempre há.
Um fé no futuro, uma coisa que se alcança, um sorriso de criança, alguém pra nos embalar.
Esperança, esperança, sempre há.

Há também uma tristeza, quase delicada, indefesa
que de vez em quando chega a se aproximar.
Vai quietinha, retilinia,
em algum ponto nos mostrar,
um tanto de lágrima e
outro tanto de dor,
algo tanto
que nossa alma possa aguentar.

Há ainda, mais fundo onde o mar que não se finda, algo ali, que insiste em me espreitar.
Um quê curioso e não sei se tão moço, ou se de tanto desgosto é que eu passo a acreditar.

Mas localizado entre a tristeza e a esperança,
no meio, uma fina lembrança,
está o amor,
a esperar.


Ouvindo_Waste Away_Spock's Beard

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Simples - cidade




Eu estava esperando por aquele momento, sabe?
Aquele momento mágico, como nos filmes, em que acontece algo grande e aí eu iria entender tudo.
Esperando que iria acontecer algo que mudaria minha vida para sempre, como um beijo inesperado, uma carta do nada, ou quem sabe uma cigana que me contaria todos os segredos e aí, enfim, eu saberia.

Esperei por algum tempo, procurei em alguns buracos e em outros tantos livros, me enchi de falsas esperanças e olhava apavorada na janela pra ver se alguma coisa acontecia e... nada.
Nada de novo, tudo como sempre, pensava eu desatinada.

Mas um dia, enquanto eu olhava pro passado, pensei: "Uau, quanta coisa mudou!!!"
E aí mudou quando? Como? Quanto?
Como aconteceram todas essas coisas e aonde estava eu que não percebi tudo mudar daquele jeito?

Bem, eu estava lá, talvez imaginando na janela ou tentando ler nas entrelinhas algo que nunca fora escrito.
E enquanto isso as coisas mudavam.
Não assim, como nos filmes nem como a minha leviana imaginação pintava.
As coisas iam mudando gradativamente, devagarinho, em gestos simples, em coisas pequenas e em palavras que eu já nem sabia que havia dito e escrito.

E enquanto tudo isso acontecia, eu esperava o futuro brilhante em algum lugar secreto.
Eu tentava espiar os dias seguintes, antevendo o grande momento da mudança, onde a música iria tocar mais alto e eu realmente ia ser feliz. E como um sopro silencioso ao meu redor, as coisas iam mudando.

Como um embrião de bebê, como semente, como tudo na natureza, as mudanças maravilhosas só acontecem devagar, pra que você vá se adaptando, vá se mudando e se moldando aquela nova verdade..
Milagres diários que acontecem sem que ninguém perceba, enquanto ninguém olha, sem platéia nem tv, nem a moça bonita da propaganda a ventilar os cabelos contra o vento.

Tudo acontece sem que ninguém perceba.
E de repente, eu estava lá, ausente e presente ao mesmo tempo, olhando o tempo passar enquanto tudo se transformava ao redor.

E então eu soube.
Soube que nunca iria saber tudo, e que isso pouco importava.
Soube que lá dentro de mim, uma menina ainda sonhava cintilante com seu grande momento esperado, mas que de fato ele acontecera tantas vezes e de maneiras tão diferentes que nem mesmo o melhor diretor de cinema poderia ilustrar.
Soube que quanto mais a gente vive, mas tem a sensação de que precisa viver e aprender e que a gente deixa o tempo passar, só pra poder contá-lo nos dedos.

Soube enfim, que minha pobre memória é que me falha as vezes, nessa de se esquecer do que vivi, quase sempre acho que não tenho muito o que contar.
E agora ao invés de ficar ali, esperando o futuro chegar, vou pra rua vivê-lo, e ter tantos outros momentos pra contá-lo.

Pois silenciosamente, tudo está mudando.
Basta ajustar o olhar.




Ouvindo_Strings_Young The Giant Young The Giant.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Desinteresabafo..



Eu vejo as pessoas falando, sentindo, tocando, reclamando e pedindo..
Vejo todo mundo as pressas em contar o que está acontecendo, como se fosse extremamente necessário manter todo mundo avisado sobre a urgência das coisas que lhes acontecem.
E é triste perceber que quanto mais falamos, menos nos importamos de fato.

Fulano viajou, ciclano está no trânsito e beltrano foi dormir tarde ontem..

Nada disso altera em nada a minha vida e a sua, mas estamos lá, querendo contar pra alguém o que diabos estamos fazendo com a insignificancia das nossas vidas, tentando sempre parecer o que não somos, escrevendo coisas que talvez nem sentimos, para que? Para quem?

E vai ficando pior a cada dia, as coisas importantes se misturando com as desimportantes, tudo no escândalo, na desinformação, na cultura da polêmica, tudo pra parecer diferente, inteligente, carente, deliquente..

E nessa de chamarmos tanta atenção pra nós mesmos, esquecemos do que somos na verdade.
Esquecemos que no lugar de letras e caracteres que fingem demonstrar nossas vontades, estão as pessoas.
E elas sim, estão em conflito diário com elas mesmas...

Percebo como o mundo mudou e como minhas relações tem se enfraquecido em alguns aspectos..
As novidades que antes demoravam pra chegar, agora estão lá a qualquer momento para quem quiser ver e ouvir, nada mais é autêntico ou surpreendente por muito tempo..

Replicamos inúmeras vezes frases e fotos legais que talvez digam de alguma forma o que pensamos, sabe se lá pra que..

E as amizades..bem..
Estão em algum lugar lá..antes ou depois de milhares de coisas desimportantes, fazendo seu papel.
Até porque meus amigos não precisam saber o que faço ou o que penso a todo instante.
Eles me conhecem num nível maior de intimidade, sabem que meu olhar as vezes diz mais do que mil palavras. Que basta um telefonema ou um oi meio torto pra significar mais coisas de que todos os textos que eu escrever..

Mas essas coisas tem se perdido por aí..
A internet encurtando distâncias e diminuindo amizades..
Até porque, assumo, não sou boa em administrar tantas pessoas na minha timeline a ponto de poder chamá-las de amigas..

Mas elas estão lá..e eu estou lá também, fazendo minha parte pra colaborar com isso que eu tanto detesto..
e estou lá porque eu também não sei a saída..mas existe em mim, essa vontade que grita, de que só um dia, ou uma semana a gente pudesse ficar sem internet, telefone e tv pra poder se lembrar de como a vida era sem isso tudo..

E de como as pessoas que se importam, estão as vezes na distância de um abraço..





Ouvindo_Boyce Avenue_Viva La Vida (Coldplay Cover)

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Um cão



Um cão me surge a porta em plena noite de primeiro de janeiro de 2012.
Um cão.. um belo e enorme cão caramelo, com seu pelo brilhante e seu rabo a abanar o vento.

O olhar dele de teimosia e de mistério, passava de curiosidade a travessura conforme corria do lado de fora do meu portão.
Ficamos ali o admirando e pensando onde diabos estava o dono daquele cachorro tão bonito e tão bem tratado. Será que fugiu do barulho dos fogos de artíficio? Será que foi largado naquele lugar?
Será que era agressivo? Será que dá pra ficar?

No meio daquelas elocubrações todas, olhavamos absortos aquele pitbull que contrastava com a calmaria daquela rua pacata da cidade que grita.
Ele nos olhando de volta, com uma cara de abandono, de solidão, de medo, de tristeza.
E de certo pensando também sobre nós humanos, trancados do lado de dentro de casa, sem dar-lhe a devida atenção.

Não resistimos e esticamos nossos dedos por entre as grades para tocar os seus pêlos.
No primeiro carinho, ele deitou-se de barriga pra cima, como num sinal de total submissão.

Abrimos nosso portão devagar e esperando ele se aproximar deixamos que ficasse com o corpo embaixo de nossas mãos afim de acariciar-lhe novamente.
Os minutos iam passando e nós ali, sem sabermos o que fazer com aquele enorme espécime.

Aos poucos as pessoas iam chegando, opinando, tocando, deixando-se imaginar na história daquele cão perdido..ou fugido.
Ajuntaram-se para ver e admirá-lo em toda sua força e ferocidade.

Era como se estivessemos na frente de um leão. 
Deixavamos ele ir e vir e circular entre nossas pernas, sempre alertas para onde mirava sua boca cheia de dentes.

O meu medo se confundia com a admiração. Era como se nadasse com tubarões, como se a qualquer momento ele fosse dar um NHAC! e comer um pedaço de alguém. 


Oferecemos água e ele sugou ferozmente o quanto pode.
Não quis comer, só queria brincar com aqueles humanos medrosos...


No fim da noite, todos voltaram para dentro de suas casas e da nossa janela, ficamos olhando aquele lindo cão nos acompanhar com os olhos.
Como se perguntasse porque se encontrava naquela situação. Ou como se dissessem: "Fiquem comigo, humanos.."

E deixando ele lá na porta, a nos olhar sorrateiros, me virei e fui dormir.
Fiquei pensando nas aventuras que ele poderia ter na rua, nos amigos que poderia fazer, nos gatos que poderia caçar.
O mundo lá fora de casa, aonde as grades não lhe impediriam de correr e pular, onde as pessoas estão dormindo e a noite guarda seus mistérios, lá...onde os cães são apenas cães de verdade.



Ouvindo_Somewhere Only We Know_Keane